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A maior parte dos especialistas espera efeitos de curto prazo sobre ativos e mantém expectativa positiva para os próximos três meses.

No seu discurso de posse e durante a sessão solene no Congresso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reiterou a sua convicção do Estado como indutor de crescimento e deixou de fora reverências à demandas dos agentes do mercado financeiro.

A maior parte dos analistas viu mais sinais negativos do que positivos neste primeiro dia de seu terceiro mandato na Presidência da República. No front econômico, a avaliação de especialistas é que o discurso de posse não trouxe muitas novidades.

“Foi um discurso pobre a respeito de conteúdo programático, deixando claro que vai usar BNDES, Caixa e autarquias para induzir gasto público sem contrapartida de receita”, afirma Otávio Vieira, sócio-gestor da Nest Investimentos.

Para Vieira trata-se de um tom “muito diferente do Lulinha paz e amor do primeiro mandato, duas décadas atrás, e se aproxima mais do intervencionismo do segundo governo da ex-presidente petista Dilma Rousseff. Ele vai tentar a fórmula pseudo socialista de distribuição de renda para os mais pobres e taxar mais a classe média e os empresários.”

Agora todas as atenções estarão voltadas para o novo direcionamento fiscal, como o governo vai conduzir o equacionamento da dívida pública, dado que o Banco Central é independente e uma injeção de gastos na economia pode bater na inflação. “Em 2023, mais uma vez, a renda fixa vai prevalecer, o CDI vai ser disparado o melhor investimento de qualquer ângulo que se olhe, do retorno propriamente, ou pela relação risco-retorno. Vai ser um ano duro.”

A reedição do Minha Casa, Minha Vida, por exemplo, pode trazer dinamismo à construção civil, um dos segmentos mais machucados na bolsa ao longo de 2022. Mas há a certeza de que o agronegócio continuará sendo a bola da vez, trazendo, consequentemente, muitos benefícios e um superávit na bolsa comercial do país. 

Destaque para os Ministros da Segurança, Saúde e Educação no dia 02 em suas posses, também deram o tom do quanto estão dispostos a exercer seus mandatos e em um curtíssimo espaço de tempo, além de revogar medidas, leis e normas técnicas do governo anterior, dar o tom do seu trabalho para suas gestões.   

Para Guilherme Alano, sócio da Monefica, o mercado aguardava com certa ansiedade as primeiras medidas que seriam tomadas pelo novo Presidente da República, por conta da ausência de informações no plano de governo durante o período de transição, com cargos importantes em ministérios sendo definidos só nos últimos dias do ano.

Os primeiros sinais do governo parecem uma continuação de onde foi interrompido o governo Dilma, em 2016, com pouco apreço a questão fiscal, intervenções em setores regulados da economia, revisão de reformas aprovadas durante o período que o PT esteve fora (inclusive trabalhista e previdenciária), composição de estatais com políticos de carreira, entre outros.

Nesse sentido, as projeções têm se deteriorado rapidamente, com aumento das expectativas de juros (selic) para o final do ano e inflação, bem como o dólar sendo puxado para cima, o que atrapalha ainda mais a conta da inflação e uma perda de valor significativa das estatais listadas em bolsa, com destaque para Petrobrás perdendo mais de 20 bilhões nos primeiros dias de 2023.

“Resta saber como será a reação do Congresso quanto a essas mudanças aventadas. Quase todas elas, terão que ser avalizadas na Câmara ou Senado, e espera-se que tenha uma oposição maior do que a que o presidente Lula teve durante seus 8 anos de mandato”, argumenta Guilherme.

Com o maior uso de bancos públicos como se ensaia, pode haver um efeito adverso sobre o mercado de capitais. É de se esperar menor atividade em IPOs (ofertas públicas de ações) e M&A (fusões e aquisições). Nunca foi uma boa política jogar dinheiro de helicóptero ou, como diziam os mais velhos, queimar dinheiro, mas o Estado não é em geral um bom alocador de capital, há desperdícios e já tivemos provas em governos anteriores.

Empresários e sociedade esperam que o novo governo melhore a interlocução com o mercado e as condições macroeconômicas atuais. Quando se olha para dados como crescimento, emprego e inflação, permitiriam uma decolagem. Pode melhorar no segundo semestre, não dá para apostar agora, é hora de pilotar só com o visual e não por instrumentos.

Continuamos, como bons pagadores de impostos, aguardando reformas profundas e contundentes na tributação e na reforma administrativa do governo, medidas para conter o déficit e a contenção de gastos públicos, com vistas a um país melhor, mais leve e que consiga levantar voo. 

E isto foi ouvido na semana passada, em entrevista concedida ao jornal “O Globo”, pelo atual Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em “acertar a casa” no primeiro ano do governo, dando a entender que viriam medidas para contrabalançar a expansão fiscal anunciada.

“Se não vier nada logo, o mercado pode entender que era enrolação. Essa questão da prorrogação da desoneração vai no sentido contrário à preocupação fiscal e deve ampliar a volatilidade. Da mesma maneira, uma possível mudança na lei das estatais para permitir a mudança na política de preços também pode ampliar a cautela dos agentes”, avalia.

Encerrando a semana, na quinta-feira, 05, a senadora e agora ministra do Planejamento, Simone Tebet, tomou posse e prometeu agilidade, transparência e contingencia nos gastos públicos.

Para o presidente da Fecomércio-SC, Hélio Dagnoni, “a entidade entende que é fundamental a agenda do governo federal focar nas questões de elevação da competitividade, como a reforma tributária, redução de burocracia, qualificação profissional, bem como não retroceder nos avanços conquistados nas legislações trabalhista e previdenciária, promovidos nos últimos anos. Outra questão importante é a manutenção do plano de concessões e privatizações.”

Estimas dos índices no mercado financeiro

Analistas do mercado financeiro consultados pelo Banco Central elevaram as estimativas para a inflação e a taxa básica de juros (Selic) da economia brasileira para este ano. É o que mostra a primeira edição do Boletim Focus de 2023, divulgada nesta segunda-feira (02). Segundo o relatório, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial do país, deve terminar este ano em 5,31% – a projeção da semana passada era de 5,23%. É a terceira semana consecutiva de alta. Segundo o Conselho Monetário Nacional (CMN), a meta de inflação para este ano é de 3,25% – e será cumprida se ficar entre 1,75% e 4,75%.